Abriu os olhos
devagarzinho, quase como quem abre uma cortina á procura do sol. O silencio na
casa era tão grande que, entre a respiração dele, ela escutava a torneira da
cozinha pingando. As pernas ainda bambas caminhavam por entre as roupas no chão
do quarto, sentou ali mesmo, perto da porta que dava pra varanda.
- Eu sempre tive
juízo, talvez esse tenha sido o meu problema. Eu deveria me permitir mais,
fazer o que as pessoas dizem ser errado, não sempre,
mas pelo menos quando a mesmice batesse na minha porta. Ir além foi divertido. Esse
vazio que eu sinto aqui dentro, talvez, seja resultado dessa minha necessidade de
me permitir, é isso mesmo, eu tenho que me permitir em alguma coisa, em
alguém. Ser tomada pelo corpo, pela
pele, me deixar levar até onde eu possa sentir a alma gemer e os ossos rangerem
de tanta sintonia com alguém. Tanto pudor para quê? Se o meu corpo implora por
um sentimento desvairado, e já dá sinais que está no ápice. Vieram me dizer
essa semana que eu tenho um astral lascivo e prece nos lábios. Uma prece que
invoca o pecado...
- Acho que tudo na vida
depende da dose: a dose de amor que você recebe, a dose de carinho que você dá.
É tudo a mesma coisa, mas é preciso saber dosar. Nem mais, nem mesmo. Se você
exagerar na dose no outro dia você acorda de ressaca, se você pegar muito leve vai
ficar com o gostinho de quero mais. Tudo na vida segue essa logica. Besta é
quem ainda não percebeu.
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